A embalagem e o consumidor: de ponta a ponta

Em meio ao ímpeto dos consumidores, fornecedores de embalagem ainda não os ouve diretamente para conhecer seus desejos e receber sugestões. Eles seguem reféns dos fabricantes, para alcançar a outra extremidade da cadeia  

 
Conhecer os anseios de seus consumidores já virou obrigação para a indústria, independentemente do segmento em que atua. Mas e os fornecedores de componentes de embalagens? Eles estão de olho no que o consumidor está demandando para poder aperfeiçoar os seus produtos? Vamos começar respondendo da seguinte forma: sim, estão. Mas poderiam fazer mais. Os clientes da indústria de embalagem são as empresas fabricantes e é aí que reside a explicação pelo fato de os fornecedores não chegarem com tanto afinco à ponta final da cadeia, para poder ter esse tipo de percepção. Muitos destes fornecedores confiam no trabalho realizado pelos fabricantes, apontando que são eles que têm plena capacidade e recursos para investir em pesquisas e estudos e assim, saber o que os consumidores realmente querem.

Porém, não são todas as empresas que têm essa capacidade de investimento. Isso, normalmente, fica a cargo de grandes companhias, que gozam do fato de ter altos recursos destinados apenas para este fim. Levando este cenário para a realidade da indústria de embalagem, isso não representa com precisão o dia a dia destes fornecedores, já que a grande maioria tem as médias e pequenas empresas como principais responsáveis pela sua carteira de clientes. Sendo assim, o relacionamento entre indústria e fornecedores, com o objetivo de conhecer os hábitos dos consumidores finais, fica na dependência do porte das companhias. “Não é mais possível atuar num mercado tão competitivo sem ter informação clara sobre o que os consumidores estão comprando e sobre as tendências que influenciam o rumo das compras”, lembra Fábio Mestriner, professor de Embalagens do MBA da ESPM.

Diferentes tamanhos, receptividade distinta
Segundo descrição de alguns fornecedores de embalagem para o segmento cosmético, fica difícil levar algum tipo de insight que foi conseguido junto ao consumidor final quando a empresa com a qual está lidando é de grande porte. Isso se deve ao fato de essas companhias já contarem com departamentos especializados e direcionados apenas a esta questão. Com aquelas de menor porte, a situação muda. Estas, por sua vez, normalmente estão mais abertas a sugestões e muitas até pedem por elas. Fábio Yassuda, diretor Comercial da C-Pack, diz que nestes casos os fornecedores acabam agindo como consultores do cliente pequeno. “Ele aceita bem o palpite e pede conselhos até na hora de fazer outras coisas. O médio já acha que sabe um pouco mais”, compara.

A companhia catarinense que produz embalagens plásticas para diversos segmentos, entre eles o cosmético, possui cerca de 150 clientes ativos, sendo que por volta de 120 são de pequeno porte. Isso, segundo o dirigente, faz com que a C-Pack acabe exercendo esse exercício de conselho de maneira constante, porém, há ressalvas. “Também há o outro lado da moeda. Esses clientes não têm conhecimento técnico do produto e temos que ensinar tudo a eles em relação à embalagem. Já os clientes médio e grande sabem disso tudo. O pequeno pergunta muito”, situa Fábio Yassuda. “Alguns já investem bastante em pesquisa para isso. Mas há outros clientes menores que não estão estruturados nestes departamentos. Então, nós corremos atrás, e às vezes trazemos conhecimentos que eles não tinham”, reforça Andréia Johansen, gerente de Marketing e Vendas da Incom.

Acompanhando repercussão
Para saber como um lançamento de uma embalagem é recebido por parte do consumidor final, os fornecedores ainda acabam recorrendo muito aos retornos que seus clientes obtêm por meio de suas ferramentas. A Dixie Toga, por exemplo, confia todas as suas fichas naquilo que eles passam para ver como algum novo componente seu foi recebido no mercado. “Temos um relacionamento muito estreito com nossos clientes e, por isso, estamos sempre monitorando a aceitação das nossas inovações junto a eles, com pesquisas  e participações em feiras”, explica Andreísa Rodrigues Andreoletti, analista de Marketing da Dixie Toga.

A visão de FábioYassuda é ainda mais incisiva para confirmar esta constatação de que a indústria de embalagem tem em seus clientes praticamente o único meio de ter conhecimento das particularidades dos consumidores. “Vou ser sincero, nós não chegamos ao final da cadeia. Quando faço uma pesquisa, ou tenho uma ideia e quero saber se ela vai implacar ou não, o meu caminho natural é procurar os meus clientes do segmento e levo a eles a ideia, um desenho ou um protótipo para saber o que eles acham. O caminho correto seria chegar no Marketing destas empresas, mas a indústria transformadora não chega a esta área. Estou há mais de 30 anos neste segmento e não se chega nela. Já tive várias oportunidades de estar com eles, com quem é muito bom estar, mas o sistema não funciona assim”, revela o diretor Comercial da C-Pack, afirmando ainda acreditar que o caminho natural continuará sendo passar pelo cliente para saber esse tipo de informação.

Entretanto, o modo de enxergar essa situação é um pouco diferente por parte da Incom. Segundo Andréia Johansen, além de utilizar ferramentas de mercado como pesquisas e relatórios, visando aliar cenários e panoramas de mercado, a companhia procura priorizar a observação e faz isso indo a campo e entrevistando consumidores de maneira direta. “Nos preocupamos muito com o design das embalagens. Outra coisa que fazemos, que é algo que está em nosso dna, é entrevistarmos o consumidor antes de lançarmos um produto standart ou apresentarmos algum conceito pró-ativo para o cliente. Para isso, vou a shoppings e a campo para escutar a percepção do consumidor. Isso é algo que eu, ao lado do meu setor de design, faço. Procuro fazer uma filtragem, avalio e viso trazer esses inputs para melhorar a embalagem e para que saía com a cara do que o consumidor está querendo”, conta a gerente.

Socializando-se pelas redes
O momento atual das redes sociais e de algumas ferramentas na internet vêm tendo papel importante para produtos, marcas e empresas. Se por um lado elas podem repercutir bem e destacar as qualidades de algum item lançado ou serviço prestado, os impactos podem ser devastadores quando a análise é negativa, e isso acontece de uma maneira tão veloz, que muitas vezes a companhia não tem nem tempo de se defender e, fatalmente, a queda nas vendas ocorrem. Todos os nossos entrevistados concordam que as redes sociais possuem uma grande força, porém eles divergem em alguns pontos quanto à sua utilização. “Estamos sempre analisando a opinião dos consumidores nas redes sociais em relação às nossas embalagens. Toda informação é importante para tomada da decisão estratégica”, enfatiza Andreísa Rodrigues Andreoletti, da Dixie Toga.

Para a Incom, as redes sociais servem como termômetro do que os consumidores gostam ou não, porém, nelas, dificilmente é possível ver a inovação. “São sempre comentários sobre alguma coisa que já existe, se funciona ou não. Quanto à inovação, ou sobre algo que ainda não existe, tem que testar o conceito, fazer mock-ups, apresentações, comparações, etc; para podermos avaliar a preferência do consumidor”, opina Andréia Johansen que, mesmo apontando essas questões, diz que costuma avaliar estas ferramentas na web. A opinião de FábioYassuda, da C-Pack, é de que essa avaliação deve ser feita dentro do meio no qual está inserido, ou seja, o de embalagem. “Meu produto não é de consumidor final, mas a gente gira em um universo pequeno, que é o de embalagem e o de consumidor (indústria) de cosméticos. Mas de certa forma, acredito que estejamos super atrasados com relação a redes sociais. Sei da potencialidade que estas ferramentas possuem”, considera.

O professor de Embalagens do MBA da ESPM faz um alerta para a indústria cosmética e de embalagem quanto ao uso das redes sociais. Segundo Fábio Mestriner, elas podem e devem ser exploradas, mas para isso é preciso um certo cuidado para não entrar errado na rede. Ele ainda procura destacar que ouvir o consumidor deixou de ser privilégio das grandes companhias. “Hoje com ferramentas como Survey Monkey é possível a pequena empresa também ouvir seu consumidor. E a embalagem é muito importante neste sentido. Ela precisa conectar o consumidor ao site da empresa e do produto, que são locais de relacionamento com o consumidor e que podem ser acessados a partir de convites colocados na embalagem. A conexão dela com a web representa uma nova fronteira a ser explorada pelos profissionais de Marketing. Não dá mais para colocar o endereço do site apenas junto com o endereço da empresa na embalagem. Isto precisa estar destacado”, avalia.

Intervenção do fornecedor
Apesar da aparente dificuldade de a indústria de embalagem se relacionar diretamente com o consumidor para apuração de seus anseios, algumas companhias mostram que é possível auxiliar os fabricantes de cosméticos nesta questão. É o caso da Incom, que por meio do trabalho de campo de suas áreas de Marketing e Vendas, chega a trazer constatações importantes para seus clientes. Mas nem sempre elas são fáceis de serem apresentadas. Certa vez, Andréia Johansen foi a um shopping para tentar comprovar uma opinião que tinha acerca de um perfume de um de seus clientes. Lá, entrevistou cerca de 60 consumidores, que em sua maioria afirmaram gostar muito da fragância. Porém, quando questionados se eles dariam este perfume de presente, 90% dos entrevistados disseram que não.

“Isto me chamou muito a atenção, pois esta é uma categoria muito presenteável. E este produto as pessoas compravam para si, mas escolhiam outro na hora de dar de presente. Na verdade nem foi uma surpresa, pois era algo que eu já imaginava. Batia na tecla de que meu cliente precisava renovar o design da embalagem e isto foi muito difícil, pois o produto vendia bem. Porém, tentava passar que ele tinha um mercado muito maior que ainda não havia explorado. Passei esse imput de que talvez fosse a hora de renovar sua embalagem, mas foi difícil para ele reconhecer e começar a mudar”, relembra a gerente de Marketing e Vendas da Incom.

Cenários por vir
Se a distância entre indústria de embalagem e consumidor é longa, para o dirigente da C-Pack esta situação permanecerá do jeito que está. Isso quer dizer que os fornecedores continuarão não buscando espaço para ouvir aquele que está na ponta final da cadeia. “Não estou convicto de que clientes da indústria que investem um alto valor em pesquisa de mercado queiram isso. Eles têm elementos para tal e talvez nós não tenhamos tanto recurso para ir tão fundo quanto eles nestas questões. Eles conseguem muito isso no SAC deles e me chamam muito para ouvir o que as pessoas estão dizendo neste serviço. Por exemplo: unha de mulher quebrando ao abrir tampa flip top, mas quem trouxe isso não foi diretamente o consumidor final. Ou um produto que está vazando, quem me traz isso é o SAC de empresas grandes”, observa Fábio Yassuda.

Andréia Johansen, da Incom, reforça dizendo que a indústria de embalagens cosméticas no Brasil poderia pesquisar mais. “Acho que o brasileiro ainda pesquisa pouco. Geralmente faz isso com viés, já achando alguma coisa e aí ele vai para tentar encontrar respostas. Isto poderia ser melhor trabalhado. Há campo para se fazer mais pesquisa. A gente acaba ficando muito reativos aos que os nossos clientes imputam e creio que a indústria de embalagem pode agregar muito mais. Mas para isso, é preciso ter uma metodologia para fazer essa pesquisa mais consistentemente”, finaliza.
 

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